Cinco a cada 10 pacientes com câncer têm alguma comorbidade emocional

O diagnóstico de câncer é acompanhado por um choque emocional significativo. Tanto o paciente, quanto a família, experimentam medo, ansiedade e incertezas sobre o futuro. Segundo dados de 2020 do The Oncologist, cerca de 30 a 50% das pessoas que enfrentam a doença possuem alguma comorbidade psiquiátrica. Além disso, o estudo mostra que a depressão é de duas a quatro vezes mais comum nesse grupo do que na população em geral.

Outro levantamento, este publicado pela Organização Mundial da Saúde (OMS), durante a pandemia da Covid-19 identificou que, diante de 6.213 pacientes com câncer, 23% tinham depressão, 17,7% ansiedade, 9,3% sintomas e diagnóstico de estresse pós-traumático e 13,5% ‘hostilidade’, transtorno psiquiátrico interpretado no Brasil como ‘transtorno de agressividade’.Nesse sentido, cuidar da saúde emocional durante o tratamento tem o mesmo peso que as terapias clínicas.

Nossas emoções reverberam no corpo físico, portanto se não estivermos bem mentalmente, dificilmente vamos conseguir suportar qualquer enfrentamento ou dificuldade. E essa premissa não se aplica apenas para o paciente oncológico, mas para todos nós.

No caso dos pacientes com câncer, ao descobrirem a doença, a maioria passa pela chamada cinco fases do luto, definidas pela psiquiatra suíça Elisabeth Kübler-Ross, em sua obra “Sobre a morte e o morrer”. O luto, aqui, não está relacionado apenas à morte de maneira literal, mas a um processo de mudanças como separações e divórcios, diagnóstico de enfermidades, encerramento de ciclos, etc. Elisabeth pontua que os cinco estágios do luto começam pela negação, no qual a pessoa se recusa a entrar em contato com a realidade que lhe cerca.

O paciente oncológico, por exemplo, chega, nesse primeiro momento, a ficar cético, além de não acreditar no diagnóstico. Depois vem a raiva, onde ele se revolta com tudo e todos, se sentindo injustiçado. Posteriormente começa uma fase de negociação/barganha, entre elas fazer promessas para Deus se for curado. As duas últimas etapas são a depressão - na qual se isola do mundo externo por se considerar impotente e triste diante da incapacidade de lidar com a dor - e a aceitação, momento em que, apesar de enxergar que a realidade é dura e penosa, deve ser enfrentada.

Todos os pacientes podem chegar na fase de aceitação, alguns, obviamente, precisarão de mais ajuda. Porém, quando chegam nesse patamar, o processo fica mais leve. Quem fica imerso em dor e lamentação, infelizmente não consegue enfrentar o momento.

Estar na fase de aceitação é um convite, sobretudo, à reflexão que pode resultar em crescimento pessoal e reconstrução de valores. Muitos pacientes começam, nesse instante, a eliminar alguns hábitos/vícios e investir em novos, como atividade física e alimentação saudável. Essa ressignificação pode, até mesmo, transformar o sentimento negativo e punitivo do início do diagnóstico em aprendizado.

Ao fazer essa mudança interna, naturalmente outros caminhos positivos são acessados no tratamento. O paciente precisa entender que o tratamento não compreende apenas ir ao oncologista e fazer quimioterapia. Cuidar da saúde mental é um importantíssimo gesto de autocuidado.

Além da saúde mental, outros pilares fundamentais que devem ser colocados em prática durante o tratamento oncológico: saúde, emocional, que se refere a como gerimos nossos sentimentos e a capacidade de perdoar; saúde social, que pressupõe a manutenção de verdadeiros vínculos capazes de serem a força do paciente nos momentos de fragilidade; saúde familiar e a espiritual.

 

Daiana Ferraz, Oncologista